Não. Nunca encontrei pessoalmente Kerouac, apesar de ter vivido quase seis anos nos States e ter me apaixonado pelos seus livros. Vivi grudada na Costa Leste (Washington D.C e depois Nova York) de 1959 ao finalzinho de 1964, enquanto ele vivia lá na Costa Oeste, bebendo até morrer, sem aproveitar a fama e o dinheiro que ganhara escrevendo. Um rapaz que vivia com a mãe, e cuja única ambição era poder ganhar com o que escrevia dinheiro para comprar uma nova geladeira para ela. Eu, engessada no protocolo diplomático, good girl, casada, tendo filhos –foram três em cinco anos e meio, em um período incrivel de criatividade em todos os sentidos. Escrevi meu primeiro livro importante de ficção, o Caos na Sala de Jantar, também comecei a escrever para teatro, pertenci a um grupo profissional que ficou na história teatral americana, The Open Theater, tive peça produzida em Nova York. E convivi , morando no Greenwich Village, com outros beatiniks...Belos tempos – que o golpe militar brasileiro de 1964 estraçalhou – como já contei em artigos publicados, mas que voltarei a esmiuçar mais tarde.
Mas o que eu queria mesmo era fugir com Kerouac, ir viver com os beatniks, renegando o meio diplomático de pastoso tédio. Eu dizia para Sergio Paulo, meu marido: “ E se a gente largasse tudo e fosse viver como eles? “ Foi quando devorei The Subterraneans, depois do sagrado impacto recebido de On The Road, The Dharma Bums.... Repetia , sem saber – só depois me contaram- uma cena que se passara há um meio século ou mais, entre minha avó Ana Thereza Pinheiro do Amaral e meu avô Marciano Jorge do Amaral, na escala modestíssima de Piracaia, interior do Estado de São Paulo, onde meu avô era tabelião: um circo passara por lá e Nhãna (que se casara aos 16 anos), insistia com o marido: “Por que a gente não deixa tudo e foge com esse pessoal do circo?”
Kerouac, Faulkner, Henry James – só depois de conhecer essa trindade, de ter a graça de poder lê-los na língua original, de estudar sua obra, é que senti vir se formando dentro de mim a “voz literária” que hoje ainda dialoga comigo.
Mas o que eu queria mesmo era fugir com Kerouac, ir viver com os beatniks, renegando o meio diplomático de pastoso tédio. Eu dizia para Sergio Paulo, meu marido: “ E se a gente largasse tudo e fosse viver como eles? “ Foi quando devorei The Subterraneans, depois do sagrado impacto recebido de On The Road, The Dharma Bums.... Repetia , sem saber – só depois me contaram- uma cena que se passara há um meio século ou mais, entre minha avó Ana Thereza Pinheiro do Amaral e meu avô Marciano Jorge do Amaral, na escala modestíssima de Piracaia, interior do Estado de São Paulo, onde meu avô era tabelião: um circo passara por lá e Nhãna (que se casara aos 16 anos), insistia com o marido: “Por que a gente não deixa tudo e foge com esse pessoal do circo?”
Kerouac, Faulkner, Henry James – só depois de conhecer essa trindade, de ter a graça de poder lê-los na língua original, de estudar sua obra, é que senti vir se formando dentro de mim a “voz literária” que hoje ainda dialoga comigo.
4 comentários:
Surpreendente e maravilhoso.
Obrigado por compartilhar vivas estórias, Cecília!!
O anônimo ai de cima sou eu, Luiz Contro.
Nunca li os originais, mas li muito de e sobre Kerouac, ele é um dos meus autores preferidos. Ele e Leminski me apresentaram o haicai, esta forma poética que amo, e tanto um quanto o outro reformaram e ajudaram a inserir no Ocidente.
Ah, essa vontade de fugir, do Kerouac, sua, da sua avó, e que eu tive (e tenho ainda) também, Jung explica :-)
Abraços!
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