12 abril 2011

JOSEPH HART VAUDEVILLE - 6



capítulo IX


FRATURA EXPOSTA



Parece que não.

Parece que não vai. Não tem graça, borboleta furada,

não vejo nenhuma graça na cabeça de alfinete que prendia, então, as noites e os tablados. Adão, naquela época, chamou cada bicho de bode, cachorro, elefante

ou vespa. As palavras, hoje quando, entretanto, não têm mais serventia. Uma família de refugiados atravessa a fronteira do Líbano em 1982. Moscas azuis caídas em sapatos e omoplatas esquálidas. Não prestam. As palavras não servem

para suturar. Lábios, ossos ou feridas. Nervos. Cartilagens. Músculos falidos. Não vai. Achtung! Bruta chuva, bruta chuva. O tédio varre a Palestina, o Irã, a Líbia e o Egito. Parece que. Parece que não. O tédio que acompanha o tiroteio, o ódio e o exílio fratura os varais, senhoras e senhores, do nosso folhetim.


Aldrich? Anão de merda. Enfie a cenoura na boca e fique quieto. Página em branco, é o que há. Palavrões. Nada será capaz de rabiscar, ó agulha. Ó crueldade. Palhaços, trupe de folgazões, saltimbancos. Profissionais sérios. Nossa Senhora e o seu filho na beira da estrada, num jumentinho que vai para o Egito. Sem pecado. Crianças que não querem crescer. Sem pecado, sem pavor. Pegue um charuto, lamba a ponta do polegar. Bora, Maria Amélia, folheie as páginas. Você está vendo? O que é que você está vendo? Choveu ontem à noite. Pegue a caneta, rabisque, rasgue o folhetim. Não adianta. Parece que não vai. Páginas cheias de formas, páginas trituradas, manchadas de lama, lanhadas de alto a baixo ainda são páginas em branco. Parece que. Os mongóis passaram por aqui, tomaram, saquearam tudo. Parece que. Veja, Araújo Bueno, Joseph Hart leciona o opróbrio em cabarés de pura angústia. Revólveres ao alto e pés no chão, Benevides. Os nossos ventrículos estão mal costurados. Lábios de ferida. Cheios de mosca. Anjos e palhaços, Marcelo, esgueiram-se pela beira da estrada. Num ponto de ônibus, sem verve, sem nada. Lonas frouxas, cordas e um palavreado maldoso. A Sagrada Família vai para o Egito. Rafa Carvalho, você está na platéia? Por favor, avise pra O´Havell quando estiver bem na hora de apertar o gatilho, tá certo?




Parece que não

vai. Aranha, grilos e formigas. Parece. Alfinetes traiçoeiros, escondidos nas areias do deserto. raspando a carne viva dos meus pés e das minhas mãos. Bata palmas, João Batista, bata palmas.O burrico trotará indiferente. Os saltimbancos voltarão, senhoras e senhores, no dia 26 de maio.

O folhetim prosseguirá. Firme e forte. As palavras e as borboletas, memsahib pupin, têm serventia. Ossos e feridas. Nervos. Cartilagens. Pé de cabra. Não quero choro nem vela. Músculos flácidos. Achtung! Não procure, Aldrich,

a batida perfeita de Flaubert. Não vai. Parece que. Parece que não. Não vai dar certo, anão. Enfie a cenoura na boca, Chast Aldrich, achtung! e fique quieto até o próximo capítulo. O posto de gasolina já está bem perto.Rodas de carroça, lonas bem amarradas. Pinguim de geladeira, bibelô de porcelana. Vamos em frente.




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