“A gente nunca pode desistir de encontrar sentido no aparente absurdo de nossa existência.”
Moacyr Scliar (★1937 - †2011)
Quando já se tem e não é pouco, surge o mais, tão atraente que excita o corpo, ao superexcitar a mente. Passa-se a mentir para o que, de fato, é sentido. Uma ganância quer lhe esganar até o gozo, então você se envaidece, mas teme apostar na sorte do novo, por receio de perder o todo e reconstituir-se do zero. Ciclos. Natural expirar e existir várias eternidades numa mesma vida, só não sabemos até quando, nem onde ou qual será a intensidade. Revigora o sangue e também gera a pira. Cabe aos nós se desfazerem com esse fogo que gira, separando em brasa um fio de outro, feito o filho do ventre da mãe, parido para o mundo, por mais que ela demore a descobrir que nada, nem ninguém, pertence às nossas expectativas. O que não se pode desenlaçar é o tempo. Certo que a memória se desmancha quando queremos, mas há algo que nos força a reter, mesmo porque já bem existe em nós. E o que há? Passagens. Possuímos vários orifícios na carne e cada um deles conecta o exterior à alma, vice-versa. O olhar é limitado de visão, porém vemos o que ela alcança, um horizonte, assim como quando cegamos. Fica mais claro para o lado de dentro e os outros sentidos mais aguçados geram o plano de fundo.
Há de se querer ficar mouco para não perceber os excessos de fala no humano vizinho, porque a escuta é mais astuta para apreciar o cantar da passarada ou a voz de outra música que bem nos faça. A boca é múltipla, fala e degusta, beija e cospe na cara, ofende e rasga seda, vaia e até escreve, tudo pela transmissão da gente, pela transfusão de genes a desmantelar qualquer equilíbrio. Dos buracos que são mais em baixo, intrometemos, mas logo excretamos. Se paira no prazer, transcende, sêmen vira ser vivente, perpetua o que perderemos ao envelhecer. Portanto, eu prefiro a morte anunciada do medo, que as delongas da saudade. Esse vento não volta igual, modifica a maré, crateriza o satélite, movimenta o planeta, cavuca a terra, reanima os mortos. Os poros existem para o nosso espírito poder saltar, em queda ou ascensão - livres. Tudo respira. Basta atentar.
Por: Paola Benevides
Um comentário:
traduziu com tanta precisão a fúria de um ciclone, que mais parecia estar na calmaria de uma brisa! Fiquei fã!
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