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guignard |
Antonio
Era a vontade pungente de amor que
movia os corpos nas ruas do Centro. Desiludidos, machucados e feridos, eles se
inteiravam da dor do outro, da falta de completude, da vontade de completar-se
de passado. O olhar seguia a silhueta que ele fazia. Alta esguia e triste, do
seu peito deflagravam cores, fortes que a arrebentavam. Tiros de cor:
vermelhos, verdes, lilases, mas sempre com uma força bruta de uma besta
faminta.
A cabeça sempre explode a essa primeira
lembrança, pois flanando silenciosos entre as ruas de pedras portuguesas, suas
ausências gritavam mais alto que o zumbido dos passantes. Só que gritavam pra
ela, apenas pra ela. Pois nele ela não entrava, não era, ele, invadido.O
silencio que permeava as passadas só acentuava a vontade dela de fugir. Mas o
silencio dele sufocava, pois pintava. Estava virando tinta aos olhos
inquiridores de sua observadora. No olhar que ele desviava sempre e na timidez
que ambos nutriam. Lá estava ela, mais uma vez vivendo um momento ESTOCOLMO.
Como será que ele chora? – essa
era a pergunta latente nela.
Será que se as gotas ao caírem em
uma folha branca viram lindos quadros? Será que seu rosto fica multicolorido?
Sua roupa salpicada, por sua dor,é feita de cor?
Isso aflige, pois pra ela salvá-lo
da dor em seu mundo mudo e preto e branco, é sua forma de ser menos Isolda e
mais Tristão. As cores formam furacões num paradoxal movimento de apreender em
translucida forma tais tintas, SER vibrante como ele É, e não mais percebe.
- PERCEBA – ela sussurra em
súplica.
E a fuzilaria acontece, de dentro
pra fora de fora pra dentro, e o labirinto de pinceladas, colagens, imagens e
montagens. Enquanto, liberta o grilo falante, que medrosamente não sabe o que
faz e como fará para equilibrar tantas intensões em palavras. Não é necessária
muita cor, preferindo sempre o branco e o preto, o papel e a caneta o espaço
entre eles que guardam universos, isso basta em alegrias e tristezas. Acredito,
eu, que se ela passar a língua em seu corpo vai misturar mais as cores e sua
saliva ficará doce. E sim, seria um banho de gato só para vê-lo sorrir. Afogar-se
em uma piscina de cor, quem não quer? Quem não desejaria? Todos... É cor, que
queremos sempre, numa busca constante, pois o horizonte é uma linha que se
delimita abstratamente na mente. Mas, transpor horizontes é salpicar-se de cor,
ele é feito de horizontes.
Cada corpo possui sua
intensidade, cada corpo é um oceano. O dele, pela forma como se compõe, é o
Atlântico, quente e inexplorado para aqueles que não sabem navegar. Ele sabe que
precisará atravessar, precisará crescer... Dentro e fora, cair e levantar recomeçar,
infinitamente como sua pele tatuada um oroboro temporal.
Sempre observando o viés, o modo
felino que ele anda, e o menino nos olhos atrás dos aros grossos dos óculos, que
a faz olhá-lo bem.
Em dado momento, vê-lo de cabeça
erguida, menos machucado, mais confiante é sua potencia duplicada no corpo dela
pelo corpo dele.
É a minha impotência literária evidenciada,
pois me faz pensar: Como fazer para isso ocorrer, para eles? Personagens reais
das minhas lembranças não consumadas, pessoas que são ecos da minha memória
futura... Como fazer? – me questiono contorcendo-me na cama vermelha preenchida
por cafés. E sonolenta olho meu mural, há nele duas miniaturas de Modigliani me
fazendo lembrar eles, me fazendo reverberar eles. Que a cor dele é mais, a
vontade dele é mais e ela é espectadora da cor transbordante n
ele.
Isso faz refletir,ao imaginá-los,
que só um pensamento havia; quando ela se aproximou e até hoje tenta conhecê-lo: compartilhar! Mesmo estando branca para
autopsia sem anestesia, do distinto cirurgião que a observava de tempos idos,
através dos olhos que não foram pintados. Amadeu permeava suas dores diferentes
e xipófogas.
As perguntas brotam, pois ativam a
criança interna questionadora, sedenta por respostas simples e irrespondíveis;
como: por que o céu é azul? Por que existe brisa e vento? Por que as cerejeiras
nascem rosa e ficam brancas? Por que existem bonsais? Por que o amor machuca? Por
que continuamos buscando o amar? Por que existe arte? Por que... Por quê? E nada é resposta! Nada é
todo o silencio desse que não sabe nominar, nesse que pretensiosamente ela quer
salvar. Que no fim indicam minha salvação,
por fim ele me salva...